Pais, professores e parlamentares criticam Projeto de Lei
867/15, do deputado Izalci (PSDB-DF), que quer incluir na Lei de Diretrizes e
Bases o Programa #EscolaSemPartido para “pôr fim à doutrinação política e
ideológica” em sala de aula, além de proibir a “veiculação de conteúdos que
possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos pais ou
responsáveis pelo estudante”.
A Constituição Federal prevê em seu capítulo III, que a
educação é um direito e deve visar o desenvolvimento pleno da pessoa e seu
preparo para o exercício da cidadania. Liberdade de aprender, ensinar,
pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, bem como o pluralismo de
ideias, são alguns dos princípios que regem a Carta Magna quando o assunto é
educação, mas tudo isso está sob ameaça.
Isso porque tramitam na Câmara dos Deputados cinco propostas que visam, de
alguma forma, “amordaçar os professores” e impedir a discussão sobre política,
gênero e diversidade em sala de aula. Uma delas, no entanto, tem ganhado mais
destaque. Trata-se do PL 867/15, encabeçado pelo deputado Izalci (PSDB-DF), que
quer incluir na Lei de Diretrizes e Bases o Programa Escola Sem Partido com o
pretexto de “acabar com a doutrinação ideológica” nas escolas públicas e
privadas.
A proposta – assim como os textos similares que também vêm sendo debatidos nas
Assembleias Legislativas de pelo menos 10 estados além do Distrito Federal –
vem gerando polêmica e divide opiniões na comunidade escolar.
Mãe de estudante do 5º ano do ensino fundamental de uma escola pública do DF,
Carla Dozzi, acredita que o texto defendido por Izalci vem carregado de
ideologia.
“Esse projeto empobrece a educação. Ele pressupõe que a criança não pode ter
opinião, que algo que um professor possa dizer é isento de posição. É falso
dizer que o conhecimento é neutro e chega a ser hipócrita dizer que colocar um
cartaz em toda sala de aula, dizendo o que o professor pode ou não pode fazer
vai surtir algum efeito positivo no processo educativo. O que a gente espera é
que a construção do conhecimento se dê em diálogo e que as contradições
históricas sejam explicitadas, que eles tenham acesso a diferentes leituras, a
diferentes ideologias para poder se posicionar”, diz.
O projeto, no entanto, parece querer limitar as discussões. De acordo com o
parágrafo 2º, do artigo 3º, por exemplo, as escolas deverão apresentar e
entregar aos pais ou responsáveis pelos estudantes “material informativo que
possibilite o conhecimento dos temas ministrados e dos enfoques adotados” nas
aulas. Já o inciso V, do artigo 4º, diz que o professor deverá respeitar “o
direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo
com suas próprias convicções”.
O professor André Tosta credita ao projeto fim de sua profissão. “Imagina uma
sala de 30 alunos, como o professor trabalha? Além disso, o projeto repete
muita coisa que a própria LDB já traz. Aliciar alunos já está previsto na LDB.
E isso não é feito. O professor é responsável e sabe o que está fazendo e está
contribuindo para formar cidadãos, não marionetes. Eu não posso falar de
partido, religião, sexualidade, pois qualquer coisa pode ser jogada contra mim,
por esse projeto. O professor, assim como o jornalista, precisa ter liberdade
em sala de aula para poder fazer seu trabalho da melhor forma possível.”
Para Carla Dozzi, a proposta ainda desrespeita famílias e a construção dos
projetos pedagógicos feitos em conjunto pela comunidade escolar.
“Eu entendo que essa lei quer doutrinar os professores e as famílias, porque
ela passa por um entendimento de família, de conhecimento e de valores, como se
eles tivessem os valores supremos e únicos que podem ser passados numa escola.
Eu, como mãe, gostaria que os valores da minha família, de liberdade de
escolha, de respeito ao outro nas suas escolhas, fossem respeitados. E eu
entendo que essa lei desrespeita. Quem constrói os projetos pedagógicos das
escolas é a comunidade escolar e eu gostaria que esses valores que nós passamos
meses discutindo fossem respeitados”, diz.
Professor e militante do movimento estudantil, o deputado Chico Lopes
(PCdoB-CE) também é um crítico da proposta. Para ele, o colégio é um lugar onde
os jovens despertam para as grandes contradições da vida e o ensino precisa ser
plural. “Querer escola sem partido é querer corpo sem alma. O elementar é que o
homem é um animal social e político, por isso, entendo que este projeto é
absolutamente atrasado. Deveria discutir valorização os professores, educação
em tempo integral, mas disso eles não querem saber”, afirma o parlamentar que
preside a Comissão de Legislação Participativa da Câmara.
No Parlamento, audiências já trataram o tema e trouxeram uma realidade
preocupante: a aprovação de boa parte dos deputados da Comissão de Educação.
Isso significa que, assim como vem acontecendo nas discussões estaduais, a
proposta pode ser admitida na comissão especial criada para deliberar sobre a
matéria na Câmara dos Deputados e, quiçá, virar lei.
Marta Caldas, diretora da Escola Classe 115 Norte, em Brasília, combate o
projeto, porque acredita ser impossível pensar em uma escola onde não se fale
do que acontece na sociedade. Para ela, não há educação sem discussão política.
“Há anos estamos lutando por uma educação onde a gente possa verdadeiramente
ter liberdade de falar de tudo. Agora que estamos acordando pra democracia,
para discussões onde a gente entende que o político deve nos representar e a
escola é esse ambiente onde a gente deve falar de política, religião, sexo, mas
sem fazer defesas porque o Estado é laico. Como a criança faz escolhas se ela
não conhece nada, se ela não sabe de nada e se querem deixar a escola fora
disso?”, questiona.
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), membro da Comissão de Educação, soma
forças à luta contra o Programa Escola Sem Partido. Segundo ela, com o perfil
do Congresso eleito em 2014 – o mais conservador desde a ditadura – aprovar um
texto como o de Izalci não é impossível e chama a sociedade a se mobilizar
contra a proposta.
“É necessário que a comunidade educacional, que intelectuais, se motivem a não
castrar a educação brasileira. Não há neutralidade na política e não há na
ciência. A escola é uma grande caixa de ressonância das ideias que circulam na
sociedade. Nos seus diversos níveis, com a devida gradação e bom senso, todas
as ideias devem circular na escola, como uma instituição da constituição da
superestrutura de qualquer nação. Essa proposta traz uma visão absolutamente
atrasada e fará muito mal à educação brasileira se for aprovada”, conclui.
Fonte: PCdoB na Câmara
Nenhum comentário:
Postar um comentário